Lendo junto
Na distopia feminista de Suzette Haden Elgin, a humanidade desenvolve formas de se comunicar com povos alienígenas e evolui muito com isso – enquanto retrocede em relação aos direitos femininos conquistados ao longo do século 20.
É justamente na fantasia que formulamos possibilidades, alimentamos respostas e criamos futuros possíveis para um mundo sem desigualdades, machismo e racismo.
Em 2205, mulheres são consideradas propriedade de seus pais ou maridos, e apenas uma revolução pode mudar esse cenário de horror. É isso que planejam as linguistas da trama: ao desenvolverem um idioma alienígena secreto, exclusivo para mulheres e centrado no feminino, as personagens da obra de Elgin se lançam na jornada transformadora de uma realidade bastante sombria – e com paralelos incômodos com o mundo de hoje.
Assim como algumas das personagens que conhecemos em Língua nativa, Elgin teve uma longa carreira como linguista. A língua láadan, falada exclusivamente por mulheres da trama, começou a ser desenvolvida em 1982, como um experimento social, e pode ser usada no mundo real – seu dicionário e sua gramática próprios foram publicados em 1985, um ano depois do lançamento de Língua nativa. A autora desejava provar que a língua falada por um indivíduo influencia profundamente a visão de mundo dele, e esse é um dos grandes temas do romance, que reflete sobre as limitações da língua inglesa na representação de vivências femininas. Elgin teria criado o láadan como uma resposta ao klingon, de Star Trek, considerado um idioma de referência masculino.
O primeiro volume da trilogia Língua nativa foi publicado em 1984, contemporâneo de obras como O conto da aia, de Margaret Atwood, e de outras autoras que questionaram os papéis de gênero na sociedade durante os anos 1980, inspiradas pela Segunda Onda Feminista e pelo clássico The Female Man, de Joana Russ. Assim como a obra mais famosa de Atwood, Língua nativa discute a perda de direitos básicos das mulheres e como a sociedade responde a isso. O livro também toca em pontos comuns às narrativas de Ursula K. Le Guin, como o clássico A mão esquerda da escuridão.
Perguntas e temas para debate:
- É possível perceber que idiomas têm gênero? Se sim, como somos influenciados por ele?
- De que modo a obra aborda o masculino como referência na língua inglesa?
- É possível encontrar neutralidade de gênero em uma língua?
- Como a obra difere de outros clássicos da literatura especulativa, por exemplo Senhor dos Anéis ou Star Trek, ao apresentar uma nova língua?
- A sociedade construída por Elgin é palpável, cabível de acontecer? Quais os pontos dessa distopia que mais chamaram atenção na leitura?
- A obra forma uma colcha de retalhos ao redor de personagens e perspectivas diversas, especialmente em relação à posição dos linguistas na sociedade. Como a sociedade é impactada a partir do contato com outros povos?
- Como a mudança de pontos de vista na trama impacta a imersão no universo de Língua nativa?
- Pensando na obra como um reflexo da Segunda Onda Feminista, de que modo o debate de gênero influencia na construção das personagens de Língua nativa?
- Em relação aos retrocessos dos direitos das mulheres, de que maneiras a obra difere de outras distopias, como O conto da aia?
- Qual o papel de Nazareth na trama? Quais as percepções que temos sobre ela?
- Qual o papel da língua como resistência política na obra de Elgin? Como a língua oferece recursos para transformações sociais?
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